Olhos D’água (Conceição Evaristo)

domingo, 5 de dezembro de 2021

Ficha Técnica:
Nome Original: Olhos D’água 
Autora: Conceição Evaristo 
País de Origem: Brasil 
Número de Páginas: 116 
Ano de Lançamento: 2014
ISBN-13: 9788534705257
Editora: Pallas

Oi gente que ama livros, hoje venho com a resenha do 88º livro lido em 2021 e foi Olhos D’água (Conceição Evaristo). Este foi o primeiro livro escolhido para a minha TBR especial do mês de novembro que teve como objetivo ler apenas autores negros e estava muito animada e curiosa para fazer a leitura em função dos elogios generosos que a autora e a obra sempre receberam.

Olhos D’Água é uma coletânea de contos que abordam temas relacionados à vida cotidiana, centrados nas vivências e experiências de pessoas negras, com especial destaque para as mulheres.


A realidade não é mais branda na escrita de Conceição Evaristo, muito pelo contrário: a autora faz questão de demonstrar, sem cortes ou fantasias, como é a realidade – externa e interna – de uma pessoa negra e marginalizada no Brasil.

O conto que dá nome ao livro é o primeiro dele. Trata-se da história de alguém que, ao tentar lembrar da cor dos olhos de sua mãe, mergulha em sua própria história e deixa de ser apenas filha para também ser mãe, protetora e conhecedora de sua origem.

A sensibilidade da água, assim como a sua fúria, é quase como – literalmente – um rio permeando as histórias contadas, quase narradas de uma notícia de jornal.


Mulheres mães, filhas, amantes, amadas, mulheres como são e como se sentem. Ao criar personagens e narrativas, a autora nos conta um pouco de si, um pouco de sua própria história de luta e superação ajudada por outras mulheres e homens, em busca de sobreviver nessas sociedades desiguais.

Em suas próprias palavras: “Escrevo. Deponho. Um depoimento em que as imagens se confundem, um eu-agora a puxar um eu-menina pelas ruas de Belo Horizonte. E como a escrita e o viver se con (fundem), sigo eu nessa escrevivência…”

A crueldade pode viver lá fora, mas a ternura também é uma forte personagem. As desigualdades sociais são o ponto central dos contos. Nas situações que fazem parte do cotidiano, que não devem ser consideradas como banais, como um assalto a um ônibus, a vida como pessoa moradora de rua, uma criança que se perde da sua família em meio a um tiroteio na favela, além de fome, miséria, desespero e desamparo.

Pois bem, tratar desses temas não é novidade. Há muito tempo, homens brancos privilegiados têm feito tentativas – infelizmente louvadas – de retratar outras realidades com a destreza de uma criança que aprendeu a fazer o primeiro desenho. É por isso que devemos, mais uma vez, falar sobre a “escrevivência” de Conceição Evaristo.

Muito mais do que retratar a dureza do mundo nos crimes, nas desigualdades, nas violências, a partir de grupos sociais historicamente violados – as pessoas negras, as mulheres – a autora tem a genialidade de usar as palavras para nos mostrar que essas “personagens reais” não são apenas vítimas, mas principalmente protagonistas de suas próprias histórias.

Ao mesclar pensamentos com diálogos, Conceição nos mostra a complexidade da existência. Toda personagem é, em si mesma, uma narradora da própria narrativa com sonhos, paixões, medos, raivas, amores, desamores e prazeres, o que não é novidade. O diferente é, mais uma vez, a forma de demonstrar a sexualidade, mesmo quando a sociedade tenta impor padrões fechados e sem discussões.

São 116 páginas que colocam o dedo na ferida de uma sociedade que sangra. Peço licença para dizer isso em primeira pessoa, mas Olhos D’Água de Conceição Evaristo foi um tiro no estômago do meu privilégio de mulher branca, que mesmo passando por dificuldades e preconceitos, a minha a realidade de apartamento nunca será igual à realidade de tantas Marias, Anas, Natalinas, Luamandas e Cidas presentes em Olhos d’água.

Portanto, pessoa branca que me lê, não leia apenas a mim sobre Conceição Evaristo. Leia Conceição Evaristo relatando uma realidade que nós nunca conheceremos e que se fizermos nossa parte – lembrando que não adianta não sermos racistas, precisamos mesmo é sermos antirracistas – poderemos começar a reparar os tantos erros de uma sociedade que ainda está despedaçada, mas que, com outras pessoas trilhando o mesmo caminho dela, ainda poderemos ter esperança no futuro.

Foi uma leitura intensa, mas extremamente importante. Amei!



Um pouco sobre a autora:
Conceição Evaristo é Mestre em Literatura Brasileira pela PUC Rio, e Doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense. Estreou na literatura em 1990, na série Cadernos Negros, antologia editada anualmente pelo Quilombhoje, de São Paulo, grupo de escritores afro-brasileiros reunidos, desde 1978. Dentre várias antologias lançadas no Brasil, a autora participa do livro Contos Afros, organizado por Marcio Barbosa (Quilombhoje), patrocinado pela Prefeitura de Belo Horizonte; no livro Contos do mar sem fim, da Editora Pallas, Rio de Janeiro e na Antologia Questão de Pele, da Editora Língua Geral, Rio de Janeiro, e vem mantendo uma constante publicação de poemas e contos, em Cadernos Negros. A escritora participa também de publicações, em antologias, na Alemanha, Inglaterra, Estados Unidos, África do Sul e em Angola. A produção de Conceição Evaristo é ampla, abarcando o campo da poesia, da prosa e do ensaio literário. Como escritora, ela tem sido convidada para participar de eventos acadêmicos e literários no Brasil e no exterior e tem marcado também presença nos movimentos sociais, notadamente, nos que se relacionam com a luta dos afrodescendentes.

Alguns de seus livros publicados são: 
  • Becos da memória
  • Canção para ninar menino grande
  • Ponciá Vicêncio
  • Poemas da Recordação e Outros Movimentos
  • Histórias de Leves Enganos e Parecenças
  • Olhos d’água
  • Cadernos Negros
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Ivi Campos

47 anos. De todas as coisas que ela é, ser a mãe do André é a que mais a faz feliz. Funcionária Pública e Escritora. Apaixonada por música latina e obcecada por Ricky Martin, Tommy Torres, Pablo Alboran e Maluma! Bookaholic sem esperanças de cura, blogueira por opção e gremista porque nasceu para ser IMORTAL! Alguém que procura concretizar nas palavras o abstrato do coração.




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